Helenice Seganfredo
A experiência aqui relatada refere-se às práticas pedagógicas na Sala de Recursos Multifuncionais (SRM), e ao trabalho colaborativo realizado com os agrupamentos no CIEJA Campo Limpo, com início em 2021, em meio à pandemia e às aulas remotas, continuado em 2022 já com aulas presenciais.
Fachada e entrada do CIEJA Campo Limpo
O Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos (CIEJA) Campo Limpo, situado na zona sul da cidade de São Paulo (Capão Redondo), é um espaço de acolhimento e de portas abertas para toda a comunidade. A escola surgiu há 24 anos com a proposta de atender alunos excluídos do sistema escolar, com a ideologia de uma educação libertária, a qual tem como objetivo fortalecer a autonomia dos estudantes. O estudante do CIEJA Campo Limpo pode optar por estudar em seis períodos de duas horas e meia, pela manhã, tarde ou noite, sendo que o currículo e todas as ações da escola estão em diálogo com os marcos legais e normativas para a modalidade de ensino. O CIEJA Campo Limpo tem uma trajetória histórica de percursos e conquistas para uma Educação Integral (relatada em nosso blog: https://blogdociejacampolimpo.blogspot.com).
Hoje existem dezesseis Centros Integrados de Educação de Jovens e Adultos na cidade de São Paulo, dedicados à garantia ao direito à educação do público Jovem e Adulto. São premiados nacional e internacionalmente como uma das maneiras inovadoras de pensar a educação como um todo.
Embora tenha chegado ao CIEJA em 2020 em meio à pandemia e às atividades remotas, fiquei encantada com o trabalho, as articulações coletivas e com uma nova concepção de educação já enraizada no local. Fui acolhida pelo grupo e pelo meu parceiro de dupla docência na SRM. Era tudo muito novo, pois vim de uma sala de recursos multifuncionais de uma EMEF na rede Municipal de Educação de São Paulo, com dinâmicas diferenciadas. Com formação em Educação Física (Unisa) e especializações em Deficiência Física (Unesp) e em Deficiência Múltipla (Mackenzie), cheguei com algumas contribuições e aprendo a cada dia novas práticas e um jeito novo de fazer Educação, uma educação de qualidade para TODOS.
Os espaços são pensados levando-se em conta a acessibilidade para todos os estudantes; mesmo estando em duas casas, cada espaço tem sua harmonia e trazem marcas de uma construção que possibilita o ir e vir deixadas pela contribuição de pessoas que pensaram possibilidades de acesso e permanência, deixando um ambiente acolhedor, único, cercado de plantas, borboletas, pássaros e gente feliz.
Todas as ações e trajetórias pedagógicas são muito planejadas coletivamente nas sextas–feiras. Um tema gerador é levantado e escolhido de forma democrática por toda a comunidade escolar por meio de votações em todos os agrupamentos, sendo o tema deste semestre “Saúde”. As comissões são montadas com professores, funcionários e equipe gestora, e abordam temas importantes e desenvolvem ações que garantem os direitos de aprendizagem.
Com ênfase na Educação Inclusiva, temos as seguintes atividades: as Comissões do Dancieja, uma balada pensada para a socialização e lazer das pessoas com deficiência; o Café (formativo), um bate-papo regado a um café saboroso e coletivo que consiste em uma reunião para formação, fala e escuta dos profissionais, famílias e estudantes colocarem seu ponto de vista; as parcerias estabelecidas pelo Instituto Olga Kos; e o professor de Educação Física que contribui com suas aulas de Movimentos semanalmente.
Como toda ação é muito pensada no CIEJA Campo Limpo, o atendimento educacional especializado (AEE) não poderia ser diferente. O Atendimento Inicial é realizado com uma escuta pelas Assistentes Pedagógicas Educacionais (APE), Coordenador Geral e Professores do Atendimento Educacional Especializado juntamente com a família e o estudante. Esse atendimento gera um relatório individual com possibilidades de trabalho pedagógico a partir das informações oferecidas e uma avaliação pedagógica, verificando as necessidades educacionais e o horário de atendimento, que pode ser contraturno ou colaborativo. A maioria dos estudantes já comparecem com laudos, pareceres médicos, e em alguns casos, acompanhamentos de especialistas da área da saúde. Há o acompanhamento constante em conjunto com os demais profissionais (Auxiliares da Vida Escolar – AVEs, e demais funcionários) e os professores da sala comum no convívio e processo educacional.
Para os estudantes que necessitam do AEE, são elaborados os Planos de Atendimento Educacional Especializado, pensados individualmente sobre suas limitações e potencialidades. Dando ênfase nessas potencialidades, pensamos em recursos possibilitadores de avanços e quebras das barreiras, trabalhando com esses estudantes das formas mais variadas possíveis.
As aulas na SRM são pensadas, planejadas e executadas em dupla docência, com uma equipe de especialistas de três professores sendo: Eu (Helenice Seganfredo), Gabriel Squara e Jaciara Batista Gomes da Silva para aplicar e mediar as práticas pedagógicas, com a orientação da APE.
As turmas são compostas por jovens, adultos e idosos, sendo eles pessoas com deficiência (intelectual, física, visual, múltipla e autistas).
Iniciamos o trabalho em conjunto na pandemia, tempo no qual nosso recurso possibilitador de novos aprendizados foram os recursos tecnológicos.
Aos poucos fomos nos apropriando de novos saberes, novas ferramentas e dando um novo formato de Educação, uma educação de forma remota, na qual as famílias se conectavam com os professores, fazendo uma ponte entre os saberes e os estudantes.
Percebemos que a tecnologia era um recurso potente no ensino remoto que ganhava espaço a cada dia, e que se estenderia cada vez com mais espaço no presencial.
Passamos alguns momentos, alguns difíceis, uns bons, outros nem tanto, mas sempre juntos nos superando a cada dia com novas estratégias para garantir a participação dos estudantes, e quando finalmente voltamos ao presencial para realizar uma educação de perto com acolhimento, recursos e muitas possibilidades.
Garantir a acessibilidade dos estudantes que apresentam algum tipo de deficiência, seja física, sensorial ou intelectual, é tão importante quanto promover uma Educação Inclusiva.
Levando-se em conta as possibilidades de acesso, durante nossos momentos de planejamentos e práticas pedagógicas, pensamos em recursos que possibilitem e facilitem o processo de ensino e aprendizagem para nossos estudantes.
Tecnologia
O uso da tecnologia possibilita a ampliação da autonomia dos estudantes, podendo ser uma aliada para a transformação de práticas pedagógicas e na criação de ambientes inclusivos. Estes recursos tecnológicos foram um dos mais utilizados na SRM para transpor as barreiras, facilitar a comunicação e aproximar ideias abstratas e concretas, facilitando as informações nas aulas remotas e presenciais.
Leitura e escrita
Pensar em leitura e escrita é pensar em possibilidades de autonomia para nossos estudantes. Nos deparamos com algumas limitações de visão e falta de entendimento e logo pensamos coletivamente em possibilidades que apontaram para recursos que diminuíram as barreiras e aproximaram do aprendizado.
A proposta do caderno com pauta ampliada, da ampliação de textos e figuras, de uma iluminação eficaz, introduzindo a leitura e a escrita por meio do papel e da tecnologia facilitaram o processo de ensino e aprendizagem.
Imagens
As imagens são muito utilizadas em nossas aulas, seja por figuras impressas ou projetadas na televisão; essas figuras vem dar significado às palavras, ampliar e tornar significativo o repertório de conhecimento, do abstrato pelo concreto.
Ampliação de imagens, espaços e palavras
Com a proposta de trabalhar o tema Saúde e valorizar uma alimentação saudável, começamos a juntar rótulos, embalagens, frutas e legumes artificiais para produzirmos atividades de leitura de diversas formas, e conscientizar sobre o consumo de alimentos, facilitando o entendimento e dando significado à atividade com materiais concretos.
Material Concreto
Material Concreto
Manusear as letras e organizá-las dá mais sentido à construção das palavras, letra por letra. Há também a utilização das réguas vazadas, do engrossador ou do lápis grosso para facilitar o contorno, o apoio e o entendimento de cada letra na formação de uma palavra.
Letras Móveis
A utilização da massinha de modelar possibilita o trabalho com contato manual, trabalho sensorial e facilita na construção das letras, despertando sensações e aprendizados.
Massinha de modelar
Os estímulos visuais por meio de vídeos e placas facilitam a memorização e diferentes tipos de leituras, utilizados em nossas aulas.
Cálculo
Utilizamos na SRM diferentes tipos de materiais facilitadores nos cálculos por meio do manuseio e contagem, facilitando o entendimento na sequência numérica, divisão, multiplicação, adição e subtração.
Chocolates
Movimento
Entendemos na SRM que o corpo estabelece uma sintonia com a mente. Uma vez que estimulamos o corpo para uma linguagem corporal, desenvolvemos outras linguagens. Partindo desse pressuposto, realizamos atividades motoras semanalmente, criando possibilidades diversas de movimentos com materiais, formatos e cores diferenciados, com o intuito de proporcionar vivências e sensações que estimulem a participação e novos aprendizados.
Jogos e Brincadeiras
Relaxamento e Massagem
Dança
Artesanatos
Utilizamos os artesanatos para possibilitar o senso estético e a criatividade, construindo um paralelo com as leituras e temas trabalhados em nossas aulas pelos estudantes.
Experiências
As experiências fazem parte do processo científico, fundamentando as leituras durante as aulas para um melhor entendimento, com materiais diversificados, esclarecendo os processos físicos e químicos.
Participação dos pais e equipe gestora
A orientação e apoio da equipe gestora são fundamentais, bem como a participação dos pais nos momentos de encontros, nas parcerias e nos processos de ensino e aprendizagem e realização dos trabalhos pedagógicos nas aulas remotas e presenciais.
Pensando em recursos, detectamos em nossas observações e planejamentos que não é possível estabelecer um caminho único para tornar as aulas acessíveis e compreensíveis aos estudantes com deficiência. No entanto, podemos concluir que existem instrumentos e ferramentas fundamentais para o trabalho com esses estudantes, propiciando um Educação Integral, Inclusiva com Equidade.
Um trabalho realizado em muitas mãos pela Equipe CIEJA Campo Limpo.
Helenice Seganfredo
Professora de Educação Física (E.E.Pastor Cicero Canuto de Lima) Rede Estadual SP; PAEE -SRM (CIEJA Campo Limpo) Rede Municipal de SP; Graduada em Educação Física (UNISA); Especialista em Deficiência Física (UNESP); Especialista em Deficiência Múltipla (Mackenzie).
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